4 de nov. de 2018

Comportamento Alimentar, Obesidade, Compulsão Alimentar


Através da alimentação obtemos a energia e nutrição necessários para viver. Evolutivamente, nosso organismo desenvolveu diversos mecanismos, para regular fisiologicamente o nosso comportamento alimentar, conduzindo assim os estados de FOME e SACIEDADE. Sendo assim, a extensão da parede estomacal, atividade intestinal, funcionamento do fígado, produção de hormônios como insulina, leptina, grelina, colecistocinina, entre outros, atuam como reguladores de fome e saciedade. No entanto, o comportamento alimentar está muito longe de ser apenas uma função biológica do nosso corpo, sofrendo influencias emocionais, sociais e culturais, o comportamento alimentar é um mecanismo bem mais complexo.

O ato de alimentar a si e aos outros possui significados variados e importantes na subjetividade dos indivíduos. A atribuição da amamentação e do preparo de alimentos para a família constitui um fator da construção da subjetividade feminina, em todas as festividades um ponto central da reunião das pessoas é em torno do cardápio (quaresma, ceia natalina, bolos e doces de aniversário, churrasco de comemoração, almoço de dia das mães e dos pais, etc), e a alimentação ainda é influenciada por questões culturais e emocionais, pois não coemos apenas grupos alimentares: fibras, proteínas, gorduras e carboidratos, ou apenas nutrientes como vitaminas e minerais. Escolhemos nossos alimentos conforme nossas preferencias de sabor, e nas escolhas interferem a acessibilidade do alimento, a conveniência, e ainda regulamos a quantidade do que comemos conforme a fome, a vontade de comer e nosso estado de humor. Ter uma relação saudável com a alimentação é imprescindível para uma vida saudável. Não comemos apenas para sobreviver, mas desenvolvemos com a comida um relacionamento íntimo, afetivo, cultural e social. Cerca de 90% de nosso funcionamento cerebral é emocional, por isso precisamos entender e valorizar a interferência dos nossos componentes emocionais em tudo o que fazemos, negar a predominância emocional de nosso funcionamento cerebral, exaltando nossa racionalidade é a primeira armadilha para boicotarmos nossa saúde mental, e reduzirmos a nossa capacidade intelectiva. Por outro lado, aprendermos a lidar com nossas emoções, desenvolvendo habilidades afetivas nas diversas áreas de nossa vida é essencial para obtermos sucesso em tudo o quanto pretendemos.

Para a OMS saúde é um estado de bem estar Bio Psico Social, onde o ser humano é visto não apenas como um organismo físico, mas englobando suas complexas formações psíquicas e sociais. Em discussões sobre o que seria normal (saudável), e o que seria patológico, o célebre Canguilhem relativizou, mostrando que saudável vai muito além do que um julgamento pré-estabelecido, e nos mostrou que uma pessoa é saudável não apenas na ausência de doenças, mas também quando essa pessoa percebe-se normal. Dessa forma compreendemos que a saúde psíquica, depende diretamente da influência marcante da autoimagem que construímos de nós mesmos como pessoas quanto indivíduo e quanto ser social. Os transtornos psíquicos geralmente nascem de problemas na construção dessa nossa autoimagem.

O CID-10 (10ª edição da Classificação Internacional das Doenças da OMS) dedica a categoria F50 aos transtornos alimentares, que são a alteração dos comportamentos alimentares associados a perturbações psicológicas. Nessa categoria são descritos os parâmetros diagnósticos para anorexia, bulimia, Hiperfagia, e outros transtornos alimentares não especificados. Devido a relevância estatística do grande número de pessoas afetadas pela obesidade no mundo hoje, nesse texto falaremos da Hiperfagia, também conhecida como compulsão alimentar, vício em comida, glutonaria, etc. A Hiperfagia é comportamento de comer excessivamente, existindo variações do padrão desse comportamento, que pode ser episódico, constante ou variado, conforme a reação da pessoa a eventos emocionais. A Hiperfagia leva à obesidade, e a obesidade por sua vez pode levar o indivíduo a desenvolver baixa autoestima e perda de confiança nos relacionamentos pessoais, tornando-se causa de outras perturbações psicológicas como depressão, ansiedade, fobia social, neuroses, etc.

Vivemos hoje no mundo um verdadeiro surto de obesidade, fruto de uma complexa realidade que vem se construindo ao longo das últimas décadas: falha nas diretrizes alimentares oficias, excesso de oferta de alimentos fast food, mudanças nos padrões comportamentais de alimentação e atividades físicas, mudança nos padrões de comportamento social e familiar em que homens e mulheres abraçam o mercado de trabalho e o cuidado com os alimentos da família passam a ser atribuídos à indústria alimentar, entre muitos outros fatores envolvidos. Pesquisadores de Harvard, em um estudo epidemiológico ao longo de 20 anos, com mais de 12mil indivíduos, detectaram uma tendência de padrões comportamentais serem regulados pelas pessoas afetivamente próximas. Assim pessoas que tendem a não se exercitar e comer de forma exagerada, influenciam as pessoas de sua convivência, assim como o oposto também ocorre. Dessa mesma forma o ambiente é influenciado e influencia o comportamento das pessoas, pois em lugares onde as pessoas tem uma maior demanda por fast food, existe uma tendência a existir grande oferta de estabelecimentos que ofertem esse tipo de alimento, reduzindo proporcionalmente a existência de estabelecimentos onde se oferece alimentos mais naturais e saudáveis, reduzindo por consequência a oferta de opções saudáveis de alimentos. Vemos assim, que o surto de obesidade não se deve apenas ao comportamento alimentar isolado de uma pessoa, mas a um conjunto de fatores que vem sendo construídos há décadas, construindo todo um paradigma de vida do qual precisamos refletir e começar a interferir como agentes de mudança, afim de construirmos um futuro onde as pessoas tenham mais saúde, no conceito amplo da palavra. Dessa forma podemos considerar uma perspectiva holística da compulsão alimentar, e entender que ela influencia e é influenciada não só na subjetividade psíquica, mas também nos espaços sociais, e por isso tornou-se um importante fator de saúde pública, que no entanto é pouco abordada.

Muitos acreditam que Compulsão Alimentar consiste apenas em episódios, assim como a bulimia, mas sem os comportamentos expurgatórios de compensação (vômito, uso de laxantes e diuréticos, etc). No entanto a hiperfagia é bem mais ampla e complexa. Indivíduos com compulsão alimentar tendem a comer excessivamente, seja de forma constante, seja de forma episódica, e até mesmo havendo variações entre esses padrões e períodos de dieta. Ao comportamento de comer excessivamente existe a associação emocional, conforme a ocorrência de eventos estressores a pessoa pode vir a comer ainda mais que o normal, apenas parando mediante mal estar por empanturramento. Em alguns casos a pessoa não demonstra vergonha por sua hiperalimentação, mas em outros casos isso pode acontecer, levando a pessoa a comer escondido. Por conta da obesidade muitos tentam diversas vezes empreender dietas, seja por necessidades de saúde, seja por vaidade. No entanto essas dietas raramente são capazes de auxiliar, visto que diante estressores emocionais os gatilhos da compulsão podem ser ativados, levando a pessoa a voltar aos episódios ou mesmo perder a aderência da dieta, formando um verdadeiro ciclo vicioso:


*O estresse me desestabiliza emocionalmente *Como demais *Engordo *Me sinto mal por estar gordo *Quero emagrecer *Inicio uma dieta restritiva *A restrição me causa estresse *O estresse me desestabiliza emocionalmente *Como demais... 

O tratamento da compulsão alimentar visa inicialmente reduzir a compulsividade alimentar, trabalhando as habilidades emocionais do paciente. Nos protocolos de Terapia Cognitivo Comportamental prevê-se treino em solução de problemas, treino de habilidades sociais, desenvolvimento de habilidades de automonitoria e de relaxamento. Nos protocolos psicoterápicos, é enfatizado que a dieta tradicional, por gerar muita restrição, gera frustração e por fim compulsão, não sendo possível conciliar dietas tradicionais com terapia, gerando outro conflito, pois se o paciente durante a terapia não consegue emagrecer continua sentindo-se mal com sua autoimagem, impedindo assim avanços significativos na terapia. Essa questão torna-se cíclica por fim, pois se faz dieta sem terapia, não trabalha seus estressores que provocam a compulsão e portanto não consegue ter aderência suficiente para a dieta fazer o efeito pretendido, mas se faz terapia sem dieta, por não estar emagrecendo não consegue mudar sua autopercepção. Nesse contexto a Terapia Cognitivo Comportamental inclui em seus protocolos a possibilidade de dietas pouco restritivas, associados a um trabalho de orientação nutricional que dê ao paciente consciência de como seu corpo interage com os alimentos, bem como o desenvolvimento de um repertório comportamental que leve a pessoa a mudar a forma como se alimenta. Bernard Rangé sugere os seguintes comportamentos, para uma relação mais saudável com a alimentação:

1)Alimentar-se apenas em lugar especifico para esse fim.

2)Quando estiver se alimentando não fazer outras coisas simultaneamente.

3)Deixar um pouco de comida no prato ao final das refeições.

4)Em vez de comer para se acalmar, apenas comer quando sentir FOME.

5)Comer lentamente, desenvolvendo a habilidade de perceber a saciedade.

6)Prestar mais atenção aos indicadores fisiológicos de FOME e SACIEDADE.

7)Reduzir a disponibilidade de alimentos quando se está comendo, guardando a comida excedente.

8)Não ter alimentos prontos para consumo, para que tenha que preparar cada refeição.


1)Alimentar-se apenas em lugar especifico para esse fim.

2)Quando estiver se alimentando não fazer outras coisas simultaneamente.

3)Deixar um pouco de comida no prato ao final das refeições.

4)Em vez de comer para se acalmar, apenas comer quando sentir FOME.

5)Comer lentamente, desenvolvendo a habilidade de perceber a saciedade.

6)Prestar mais atenção aos indicadores fisiológicos de FOME e SACIEDADE.

7)Reduzir a disponibilidade de alimentos quando se está comendo, guardando a comida excedente.
8)Não ter alimentos prontos para consumo, para que tenha que preparar cada refeição.

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